Carlos Eduardo Taddeo

Entre o Paraíso e o Purgatório


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Quando liguei pro meu filho e outra pessoa atendeu
Meu coração me disse o pior aconteceu
Era um pm informando que ele foi alvejado numa moto
Depois de passar atirando numa base movél
Não era engano era outra típica armação
Dos que quebra própria viatura em manisfestação

Fui pro DP já imaginando seu restos mortais
Na pia de um nucleo de perícias medico legais
Pra minha surpresa entrou com vida no ps da sul
Porque uma lei obrigou os vermes esperar o samu
Corro em vão pra emergência do hospital
Não deixa eu ver o paciente sobre custódia policial
Doutor que tem que autorizar não ta no plantão
Bateram com dedo de silicone o seu cartão
Só no outro dia o vejo algemado numa cama

Com tubo na garganta pra ventilação mecânica
Um gambé me impede de ficar pra acompanhar
Se acordar quer ditar a versão pra ele decorar
Não demorou pra morte cerebral surgir no diagnostico
Com pedido de autorização pra doação dos órgãos
Mesmo abalado pense outro vantajoso laudo sem testes
Sem reflexo da córnea estimulado com cotonete
Tô indeciso porque o ato que salva oito doentes
Pode dar ferias no Sea World pra quem vende pedaços de gente

Não quero ser o coração na corrente sanguínea de gelo
Nem suas córneas dos olhos que só enxergam dinheiro
De um lado vidas do outro monstros com jaleco branco
Quem sorrirá se eu decidir ter um gesto humano
Toda mão pobre entra em bom estado neurológico
Em uma semana vira candidato a doação dos órgãos
Pra não sujar deixam sem monitoramento

Depois alegam que o enfermo não reagiu aos medicamentos
Nesse prazo a família semianalfabeta sem cabeça
Já se acostumou com a idéia da perda
Ai é só pegar o isopor com gelo
E levar o rim pra clínica que secretamente atende estrangeiro
Quem brinca de Deus em unidade de terapia intensiva
Ganha fotos no corredores da classe rica
Além de órgãos as doutoras virginias do inferno
Geram demandas empregos em funerárias em cemitérios
Junto com tour sexual nossa pátria repugnante

Oferece pro exterior turismo do transplante
É só fazer oferta pro medico certo
Que sua equipe coleta globo ocular até no necroterio
Como eu queria ter a chance real
De intoxicar um deles via sonda nasoenteral
Dahora o bip acelerando no monitor cardíaco
Enquanto o fim vai da narina ao estômago do maníaco
É publico e notório chegou baleado no hospital
Se tornou um doador cadáver em potencial
Não importa frase escrita no seu RG
O órgão que interessar vão roubar de você

Não quero ser o coração na corrente sanguínea de gelo
Nem suas córneas dos olhos que só enxergam dinheiro
De um lado vidas do outro monstros com jaleco branco
Quem sorrirá se eu decidir ter um gesto humano
Agora sei porque não dão informação
Sobre o destino de um fígado um coração
Já pensou que puta dia trágico infeliz
Descobrir que um gesto nobre salvou um Abílio Diniz
A lei de cassação no conselho federal de medicina
Deviam ter que doar seus órgãos em vida

Desconfiado vou pagar por outra opinião medica
Quero ver se bate um parecer impresso em papel moeda
O advogado a peso de ouro conseguiu a liminar
Que permite tratar meu filho em outro lugar
Desfiz do corsa dos moveis da residência
Pra arcar com custo abusivo da transferência
Como esperar do exame onde a cura é vendida
Aponta funções cerebrais em perda definitiva
Pode ter sequela bala alojada na ossatura
Mais de forma alguma vai sentido sepultura

Os infratores da lei nove mil quatrocentos e trinta e quatro
Por pouco não depenaram mais um pra trocar de carro
Só me resta rezar pra quem tá nesse momento
Ligado a maquina de diálise cilindro de oxigênio
Avisar aos receptores que os órgãos a disposição
Tão nas sedes governamentais da nação
Nas casas legislativas e no palácio da alvorada
Todos sanguessugas tem morte encefálica


Autor(es): Carlos Eduardo Taddeo

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